com que comemos galinha ao molho pardo,
dou-me conta de nossa truculência.
Eu, que seria incapaz de matar uma galinha,
tanto gosto delas vivas
mexendo o pescoço feio
e procurando minhocas.
Deveríamos não comê-las e ao seu sangue?
Nunca.
Nós somos canibais,
é preciso não esquecer.
E respeitar a violência que temos.
E, quem sabe, não comêssemos a galinha ao molho pardo,
comeríamos gente com seu sangue.
Minha falta de coragem de matar uma galinha
e no entanto comê-la morta
me confunde, espanta-me,
mas aceito.
A nossa vida é truculenta:
nasce-se com sangue
e com sangue corta-se a união
que é o cordão umbilical.
E quantos morrem com sangue.
É preciso acreditar no sangue
como parte de nossa vida.
A truculência.
É amor também.
Clarice Lispector
7 comentários:
Adoro esse texto , Dario.
Forte , intenso !!!
Truculência e sangue ...
Bjo grande e que seu Domingo se
faça feliz. :)
Ao sangue relaciona-se união, forças, pactos... Há muito sentido nessa expressão... É morte, é vida, é ligação!
Pobre da galinha que não nasceu grama, que tem mais sentido em nascer pra saciar a fome que pra perceber a vida, fome de vida!
Triste é o fim que inicia e morre na barriga...
Nossa cultura é canibal, por isso o somos sem culpa e com culpa, mas somos...
É muito complexo e há muita hipocrisia nesse contexto!
Adorei o tema, desculpa por me passar nas linhas, sem querer me espalhei por aqui... rsrs
Bom Domingo, querido amigo
Bj
Tudo se contradiz... o ser humano é uma contradição! Bela... dinâminca e mutável... mais ainda contraditória...
Deixo beijo...
Carinho e sangue...
Sil
Sempre aqui
Dificil aceitar quem somos!
Lindo texto, bela escolha.
Grande abraço.
Clarice e os seus encantos, seu texto denso que fica em nós.
Jesussssssssssss amado, Clarice me deixa sem AR!
AMOOOOOOOOOO, AMOOOOOOOOOOO!
Beijo meu querido!
Pior que é verdade...
Belo texto da Clarice!
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